“Um caminhão não deve transportar uma carga por dois ou três mil quilômetros. Temos de aprender a conviver com terminais que possam fazer com que os caminhões sejam apenas os coletores e entregadores das cargas cabendo aos trens e navios cobrir os grandes percursos”. Essas foram as palavras proferidas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na cerimônia de entrega da primeira locomotiva fabricada pela GE, em Contagem (MG), região Metropolitana de Belo Horizonte.

Tem razão o presidente, mas seria oportuno lembrá-lo que nossas ferrovias foram predominantemente construídas entre 1854 e 1930, para atender às exportações de produtos primários, com destaque para o café em grão ensacado. No final do governo de Washington Luiz, o Brasil já contava com 32.478 quilômetros de linhas férreas e apenas o trecho Petrópolis – Juiz de Fora era pavimentado. Com más condições técnicas em planta e perfil, a maior parte de nossas ferrovias deixam muito a desejar. A célebre frase do então presidente dizendo que “governar é abrir estradas”, parece ter inspirado os sucessivos governos a considerar que o papel de integração das diversas regiões do País cabe às rodovias pavimentadas. Com isso, o Brasil é hoje o único país de dimensões continentais, onde é insignificante a participação das ferrovias no transporte de carga geral, constituída de produtos industrializados.

Até mesmo muitos produtos a granel, carga típica dos trens e navios, são levados de caminhões. Não é a toa que, a cada ano, cem mil novos caminhões entram em circulação em nossas precárias estradas de rodagem, sendo raro o ano em que mais de dois mil vagões são produzidos pela nossa indústria ferroviária. É importante salientar que, no transporte de minério de ferro, três ferrovias brasileiras são referência mundial cujos traçados são infinitamente melhores que o restante da malha. Além do mau traçado da maioria das linhas de bitola estreita, há gargalos que limitam sua capacidade: invasões da faixa de domínio; inúmeras passagens de nível, sobretudo em áreas urbanas e metropolitanas; a interligação da malha paulista de bitola larga com da MRS, sem passar pela RMSP; a ligação da Ferrovia Norte-Sul com a Ferronorte; e melhorar substancialmente os acessos ferroviários aos principais portos do País.
Finalmente, caberia refletir como o contêiner, que revolucionou o comércio internacional em pouco de 50 anos, poderia se tornar também largamente utilizado no transporte doméstico de cargas, mudando a forma de fazer logística, permitindo a rápida liberação dos veículos rodoviários e ferroviário.

René Fernandes Schoppa – autor do livro 150 anos do trem no Brasil.
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